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Foto: House of Taboo |
“Temperar nosso
destino com a poeira de nossa loucura, esse é o truque.” (Henry Miller)
Esse texto é baseado em
fantasias imaginárias. Qualquer coincidência com a semelhança será mera
realidade.
(Na Idade Média, acreditava-se que forças malignas não
podiam fazer-lhe nenhum mal, desde que você não as acolhesse na sua alma. E
advertiam: demônios materializam suas tentações, principalmente, por intermédio
de sensações, como a dor, por exemplo.)
Não há um mecanismo lógico de disparo, apenas acontece num instante,
antes mesmo de o cérebro ser avisado, as narinas se dilatam, alertando sobre a
presença de carne implorando a ser sangrada.
Com estudada arrogância de juventude, soprou a fumaça para o teto como a
reafirmar a postura de inabalável insolência de fêmea competitiva &
confiante na tranquila manipulação da infantilidade dos apetites masculinos,
cruzou as pernas de maneira desafiadora para deixar o possível de carnes
deliciosas das coxas à mostra. O que esperava: que Eu salivasse & uivasse
para a lua?
Achava mesmo que Eu acreditava nessa bobagem amadorística de vivenciar a
experiência tão a fundo de modo a transmiti-la plena de verdade & emoção
aos leitores? A proto Hemingway menstruativa de butique de shopping estava
absolutamente convicta de ser capaz de pisar da esmerdeada lama das trincheiras
da realidade & sair altiva & perfumada direto para a cerimônia de
recebimento do Prêmio Pulitzer.
“Pode, sem dúvida, me fazer chorar de dor, mas sentir prazer &
humilhar-me a ponto de implorar pelo orgasmo? Me espanque. Já! Sem limites!”
Não tentei adivinhar onde teria conseguido a chibata que, atrevida, Me ofertava
em duelo. Nem idade, nem necessidade de aceitar esse tipo de provocação de uma
fedelha petulante, mas, como no tempo de tomar juízo preferi tomar uísque,
melhor sorrir mentalmente com o velho humorista: passarinho que come pedra sabe
o cu que tem.
Despiu-se com estudado erotismo de mulherzinha entediada que frente ao
espelho se representa heroína de livros pornográficos idealizando musculosos
machos cinematográficos encantados. O gourmet sabe que deve apreciar a carne
pelo sabor, porém, é inevitável que preferencialmente volte o olhar de
apreciador às novidades mais frescas exibidas nos ganchos do açougue.
Na nudez, o rosto juvenil não conseguia deixar de desmascarar a
primitiva fêmea animalizada em emboscada. Os seios, sem preocupação com a
estética mercantil, fartos na proporção harmoniosa para acomodarem bicos
insolentes quase descoloridos. A curva da cintura anunciava com eloquência a
depravação da boceta generosa, pelos aparados no modismo sensual, lábios do
sexo ainda calados em resguardo. A virada estudadamente casual expõe as nádegas
apertadas: se ela realmente tivesse o cu que aquela delícia de bunda anunciava...
“Pronta. O que você vai fazer agora?” A bofetada estampou um vermelho
imediato de humilhante susto dolorido sem anúncio em sua bochecha. “De agora em
diante, trate-Me apenas por Senhor & só fale quando for questionada.” A
abertura de lábios ameaçando nova palavra virou silêncio de espanto
inconformado com o segundo tapa. A orelha torcida em dor ouviu Meu comando
sussurrado & a resposta gaguejada em inconformismo trouxe a mesma voz de
antes, apenas agora sem acento de pretensão
desafiadora: “Obrigada, Senhor... um caralho!” Jovens inquietas aprendem rápido,
necessitam apenas de pequenos encorajamentos. A torção no bico de seu seio era
ácido fervente entrando em seu corpo. O grito durou um tempo indefinido, para
ela deve ter sido longo, até que se calou na inutilidade da resistência que
tentava fincando as unhas em Meu braço. “Conte, lentamente, muito lentamente, até
dez, vagabunda, dizem que é bom para recobrar a calma.” Não como sinal de
submissão, apenas ajoelhou-se numa postura natural de defesa contra o
sofrimento. A terceira bofetada atirou-a ao chão como um trapo de carne. O
choro, silencioso, compulsivo. “Como deve dirigir-se à mim, puta escrota!
O grito esguichou medo gelado em sua espinha; arrepiou-se arregalando os olhos. A raiva que
iluminava seu olhar apagou-se instantaneamente ao novo levantar ameaçador de Minha
mão & a frase mágica formou-se doce em subserviência: “Obrigada... Senhor.”
Agarrada pelos cabelos, obrigada a mover-se de quatro como qualquer
animal, levei-a próximo ao telefone: “Caso sua prepotência fraqueje &
deseje pedir auxílio a alguém, a algum
machista porco chauvinista talvez? O número da polícia deve saber. Não seja
econômica na revolta, vai tornar as coisas mais divertidas para mim & muito
mais deliciosas a você, acredite.” O deboche de Minha gargalhada estava sendo
mais doloroso do que a sola de Minha bota esmagando-lhe o rosto contra o
assoalho. Tirei o cinto e apliquei-lhe meia dúzia de vergastadas nas carnes da
bunda que, alegremente, responderam com vergões vermelhos. Gado a gente marca,
passou-Me a frase da canção de sucesso à época. Seria capaz de ficar a noite
toda torturando-a, apenas com esse humilhante tormento. “Não quer dar um
tempêro especial à sua história com o sabor da injustiça dos chãos desse
mundo?” O pavor devia ser imenso para, automaticamente, responder à ironia,
lambendo com determinação de cadela a sola de Minha bota. Podia sentir sua
língua percorrendo o couro, quase como se trabalhasse direto na pele de Meu pé.
Com gente é diferente, porém, com fêmea submetida, é igual, sempre. Liberada do
peso, abanava nervosamente a cabeça, num inconformismo animalesco impulsionado
pelo temor. Passava as costas das mãos pela boca, na inútil tentativa de
amenizar a dor dos lábios & livrar-se do azedo sabor da realidade da vida,
agora para sempre grudado em sua língua. Um filete de sangue escorria pelo
canto direito de sua boca, emprestando-lhe uma maravilhosa aparência de
desamparo.
Pronta a ser comandada como animalzinho amestrado. “Quando irá implorar
para que o prazer da dor continue a lhe ser concedido é uma questão de tempo
que dependerá mais da resposta de tuas desprezíveis carnes prostitutas do que
de Mim. Por enquanto, é suficiente que já tenha aprendido que o comando é Meu,
indiscutível & que qualquer vacilação será punida com sofrimento em dose
sempre crescente. Entendeu?” Um leve acento de revolta retornou a sua voz agora
vacilante, quando respondeu: “Sim Senhor.” Meu sadismo entesou-se em ainda
maior perversidade pela diversão que prometia ser além do que havia imaginado.
Puxei uma cadeira, apanhei a chibata & apenas encarei-a. Foram
poucos hipnóticos segundos &, sem qualquer comando, ela ajoelhou-se, olhos
baixados ao chão, respirando forte. Um velho pequeno truque que sempre funciona
com plateias novas. A vontade de rir era imensa ante aquela previsível sujeição
patética. Seu desespero era indisfarçável. “A putinha nojenta quer falar alguma
coisa? Tem Minha permissão.” Agora era a mais pura vergonha que provocava
hesitação em suas palavras. “Eu preciso, mesmo, Senhor, fazer xixi.” Impossível
manter a solenidade. A sonoridade de Minha gargalhada deve ter contagiado todos
os moradores do prédio. “Quem faz xixi é criança, sua ordinária; cadelas são
animais que simplesmente mijam. Mas claro, Me julga algum monstro sádico? Pode
fazer.” A incredulidade em seu olhar era cômica. “O que está esperando? Medo de
estragar o tapete caro que ganhou de presente do papai rico? Se demorar mais um
minuto, posso Me arrepender. Portanto: mije, já, animalzinho escroto!” Apesar
da inutilidade, ainda tentou com os olhos implorar por piedade, mas o medo
empurrando a natureza encarregou-se de revelar a indignidade conformada e o
filete de líquido quente amarelado começou a verter, a princípio tímido, depois
incontrolável como um dique rompido, da racha de sua boceta, escorrendo por
suas coxas e fazendo crescer uma poça mal cheirosa onde flutuavam seus joelhos.
Quase irresistível, mas Eu precisava parar de rir apesar do rídiculo de sua
vergonha por, degradada, estar prostada & emporcalhada daquela maneira.
Retomar a ritualidade do horror. “Sua porca! Lamba a sujeira que fez.” Pelos
cabelos esfreguei sua cara naquele alagado de urina. Hesitei um segundo, optei
ainda pelo cinto. A chibata deveria vir num momento mais cerimonial. As
pancadas com maior violência prestigiavam agora a brancura das costas &
eram respondidas com maravilhosos gritos & gemidos, entesante trilha sonora
para o diabólico desenho que ia se formando em sua pele.
Seu rosto transformado numa máscara úmida e pastosa expressava absoluto
desamparo & incompreensão. Poderia ser ainda mais repugnante? Decidi ser
piedoso & ofertar-lhe a resposta. O sadismo ditou o tempo e a pressão exata
de Meu dedo descendo por suas costas, com perversa lentidão, até intrometer-se
decidido pelo vão de suas nádegas, alcançar a interdita entrada de seu ânus
& invadir decidido o umedecido território de seu cu. A dor intensa
arrancou-lhe outro grito desesperado que explodiu de seu peito até morrer no
silêncio do desamparo, sugando o ar entre os dentes. Tentou esquivar-se, porém,
o encaixe perfeito não lhe permitia escapatória & então, simples & suavemente
rendeu-se, afrouxou os músculos &, ao contrário de resistir, arreganhou-se
o mais que pôde para, mais do que acomodar, derrotada, incorporar aquele
indecente intruso inquieto no mais fundo de seu corpo. A sobrevivência da carne
impondo-se à razão. Seu respirar era pesado, compassado, porém, um novo
elemento incorporava-se ao seu servilismo ofegante: sem dúvida, estava
experimentado uma tormentosa sensação de deleite no desfrute daquela dor
obscena. Inevitável: a fêmea havia ingressado no sem volta do caminho da
depravação. Quase involuntariamente sua bunda oscilava numa dança degenerada ao
ritmo da ponta de Meu dedo que arrobando cada prega de seu rabo, com
perversidade, buscava tocar o ponto infinito de seu sofrimento. Virou-se &
por sobre o ombro, entre lágrimas, mostrou-Me um sorriso de fera denunciada,
mas ainda querendo ser domada. A luxúria não consegue usar máscaras.
Retirei o dedo de seu rabo com rapidez & violência estudada para arrancar-lhe
da garganta um soluço dolorido & tornar o
incômodo em seu cu uma sensação que a acompanharia por dias & que
lhe traria lembranças Minhas pelo resto da vida a cada vez que tornasse a
sentar-se. Não importa quantas vezes tivesse feito ou viesse a fazer sexo anal:
Eu havia, irremediavelmente, acabado de violar, com impiedosa libertinagem, o
lacre de dignidade hipócrita daquele pretensioso buraco de cu.
Puxando-a pelos cabelos, aos trancos, levei-a até a mesa, fiz com que se
acomodasse de bruços, peitos desconfortavelmente esmagados contra a madeira,
braços abertos em xis, as mãos agarrando a beirada do tampo. Dois pontapés
afastaram suas pernas ao máximo. Entregue, totalmente indefesa. A boceta
umedecida exposta sem censura contraía-se ritmadamente como se tivesse urgência
em respirar para livrar-se da pegajosa saliva incômoda que vertia com
generosidade, como se vômito & prazer fossem sinônimos. Apesar de tudo, sua
bunda, majestosa, dominava o cenário, sabendo-se, instintivamente, a personagem
principal, à espera apenas do sinal do maestro para realizar seu ansiado solo.
Acendi o cigarro, traguei fundo a fumaça, pousei Minha mão em sua bunda
& com premetidado cinismo falei baixo em seu ouvido: “Nenhuma melodia mais
agradável aos ouvidos de um sadista do que os gritos & gemidos da submetida
em martírio. Porém, esse apartamento não é o local mais indicado para esse
suplício & não vamos querer escandalizar os sensíveis ouvidos da vizinhança
de bacanas, não é mesmo? Poderia simplesmente amordaçá-la, mas preciso que
esteja com a boca livre. Então, não quero ouvir um pio sequer durante a
flagelação. A destemida mocinha não irá Me decepcionar, certo? Vamos fazer um
teste.”
A brasa do cigarro pousou decidida na carne de sua bunda & foi
queimando sem pudor até ser esmagada. Dela apenas um grunhido atormentado que
foi se transformando num choramingar de sonoridade felina, infantil até, quase
inaudível do bar ali perto. Porra, vinho é um suco de uva que deu errado! Essa
vadia tem apenas esse só quase final de garrafa de mijo de virgem escocesa com
aroma de turfa, sabor de malte e álcool de embebedamento onírico na casa &
nem da Minha marca? Well, scotch pelo menos. Distraída olhada nos LPs. A
putinha pernóstica até que tinha algum gosto. Ah, revelação!
Ia aprender que vida tem uma letra a menos o que merda, mas quase sempre
pode cheirar pior.
A agulha sussurrou o protocolar chiado & logo os acordes de “Capricho Catalán” escorreram toda a
limpidez de sua sanguínea espanhola sensualidade pela ponta dos dedos de Andres
Segovia. Voltei a colocar Minha boca colada a seu apavorado ouvido: “Hemingway
tinha quarenta e um anos quando escreveu Por
Quem Os Sinos Dobram. Quarenta e um pode ser um número emblemático para
quebrar tua resistência de vaca que não merece o desprezo de ser toureada. Vai
contar as chibatadas uma a uma. E a cada uma lembre-se, prostitutazinha: não
perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti.”
Seu interior já está incendiado, por menos que admita. “Agora vamos
trazer esse fogo para fora, atravessando toda sua carne, até a superfície de
sua pele.” Sentiu a primeira mordida impiedosa do couro.
“Uma.”
Doeu? Pois agora vai saber o que é a dor na sua mais pura essência, sem
adjetivos.
“Duas.”
Calvário. Abriu os joelhos em estremecimento convulsivo. O som agudo das
tiras da chibata atravessando o ar, despencando-se, depositando lindas marcas
naquela pele branca. Vergões ardentes.
“Três.”
Recitando os números de sua ladainha de dor. Medo, era o desamparo
personificado, porém, seu corpo atestava que pela dor & humilhação estava
se realizando em úmido prazer descontrolado.
“Quatro.”
Todo seu líquido repertório de sucos femininos vazando por boceta &
cu, misturados ao suor do sofrimento.
“Cinco.”
Espasmos involutários, sem dúvida de prazer, em resposta ao som breve
& cortante da chibata impiedosa.
“Seis.”
Dor & prazer, sentimentos gêmeos juntando-se numa única realidade de
fervente delícia enlouquecida naquele corpo seviciado.
“Sete.”
Tremendo de gelado pavor no meio da fogueira de suas frustrações
derrotadas.
“Oito.”
Delícia assistir aquele festival de hematomas & vergões
materializar-se na brancura de suas costas & ancas.
“Nove.”
Carne. Em pedaços, artigo de balcão de açougue. Arrumadas de um modo
sensual, o corpo despido de uma fêmea.
“Dez.”
Porém, sempre carne a ser devorada para saciar apetites, quaisquer
apetites.
“Onze.”
A puta submetida agradecendo pelo privilégio de ser acolhida em
servidão.
“Doze.”
Deliciada, mesmo sem entender o enigma de ser chamada de puta, sentir-se
gratificada ao invés de afrontada.
“Treze.”
Um ou outro risco avermelhado tornou-se mais intenso, brilhou líquido e
então, escorrendo sangue.
Lágrimas vermelhas de morte & vida.
“Quatorze.”
Cada chibatada recitada: pela vida carregaria uma marca de dor &
prazer para cada minuto de insolência.
“Quinze.”
Respiração curta, apressada, olhos estreitados, narinas dilatadas,
lábios retos como se enraivecidos, angústia personificada.
“Dezesseis.”
Aprendia a vadia, que a verdade é um troço contagioso que, mais dia,
menos dia, te contamina & aí não tem volta, é como radioatividade, vai
matando a ilusão da alma aos poucos.
“Dezessete.”
Conte como verdade admitida à chibata como um segredo imundo seu & a
armadilha de encarceramento à servidão fecha-se para sempre.
“Dezoito.”
Essa é a verdadeira morte libertadora & não a babaquice de que falam
todos os messias de esquinas do mundo desde o início dos tempos.
Enfrentando o seu medo & o vencendo justamente pelo pavor.
“Dezenove.”
Ardor, centelha emocionante, excitante calafrio aumentando gradualmente
no desconforto latejante do sem alívio da surra.
“Vinte.”
Boceta transbordando euforia líquida.
“Vinte & uma.”
Na claridade de seus olhos brilha o êxtase da agonia.
“Vinte & duas.”
A pretensiosa agora dispensa qualquer falsa indulgência, pois, sabe, não
importa a punição, será capaz de suportar, porque é isso que Minha vontade
ordena.
“Vinte & três.”
Seu corpo torturado agora grotesto repertório de lacerações, apenas um
brinquedo à disposição de Minha mente pervertida em sadismo.
“Vinte & quatro.”
Aquele apetitoso amontoado de carnes femininas transformado agora pela
Minha Arte para o formato de fêmea escravizada em prazer à Minha Vontade.
“Vinte & cinco.”
Transgressão para ela antes inimaginada: o corpo da puta ansiando pela
possessão em crueldade, iniciava seu domínio sobre mente & alma da mulher
entregue.
“Vinte & seis.”
Uma onda de calor indecente subia pelo ar.
“Vinte & sete.”
Mesmo sem estar amarrada, sabia não haver qualquer chance de fuga,
simplesmente porque não a desejava.
“Vinte & oito.”
A chibata chovia uma dolorida tempestade de descargas elétricas sobre a
ardência de sua pele lacerada.
“Vinte & nove.”
Aroma penetrante. Cheiro de fêmea de sua boceta invade triunfante o ar.
“Trinta.”
O apartamento cheirava agora a um salgado e enjoativo odor de organismo
vivo que, magicamente não se confundia com os hálitos & suores que seu
corpo de cadela exalava & que as paredes flatulentas inspiravam sem
conseguir transpirar.
“Trinta & uma.”
Rosto borrado pelo choro agora compulsivo pelo desprezo que experimenta.
“Trinta & duas.”
Corpo, bandeira enlouquecida, listras de dor. Suor escorrendo brilhante.
“Trinta & três.”
Suas carnes agora são o familiar, ensanguentado,
escuro caminho
subterrâneo pelo qual posso pisar
de olhos fechados, sem
cuidado, porém, com a segurança da posse indiscutível do conquistador.
“Trinta & quatro.”
Sabia, haver sido derrotada na batalha de vontades por seu próprio
instinto animal de fêmea rendida às delícias do seviciamento.
“Trinta & cinco.”
A mente da mulher tomada sem defesa em possessão pelas carnes do corpo
da vagabunda. Escultura viva, isso é, a escrava sob jugo.
“Trinta & seis.”
Soluçando, congelada em silêncio amedrontado, o fogo da raiva & do
orgulho apagado pela degradação, implorava com o olhar.
“Trinta & sete.”
“Trinta & oito.”
Corpo açoitado, nua, branca como aquela que veste a túnica da bruxa
condenada a caminho do fogo purificador. Na testa, entre os olhos, o estigma
das amaldiçoadas abençoadas pela sofisticada delícia única: saber que o
sofrimento é o preço do prazer indescritível, sem limites.
“Trinta & nove.”
O suor abundante como uma líquida embalagem transparente que, apesar de
frágil, parece ser a única força do mundo capaz de sustentar agregada aquela
massa de carnes distorcidas pela dor.
“Quarenta.”
Nada de novo debaixo do céu.
A verdade está sempre de emboscada pronta a nos assustar e pular à nossa
frente & nos cuspir na cara todos os medos que nos foram impingidos pela
falsidade do mundo dos outros.
Conheço-a pronta a implorar para
ser eleita como suicida escolhida em Minhas entranhas em labaredas sádicas.
A submissão incondicional dita-lhe a frase:
“Senhor, minha entrega a ti começa na alma & explode no gozo da
carne. Imploro que me conceda a permissão do orgasmo”.
Silêncio angustiante.
Suas carnes em alerta esperavam a permissão para cantar em gozo a
chibatada de número quarenta & um que... não veio.
Virou-se, olhos arregalados em incompreensão.
“Orgasmo? Huuum, palavra interessante na boca de uma emancipada &
liberada mulher que acaba de submeter-se de maneira tão degenerada aos Meus
instintos animalescos mais básicos. Por quem os sinos dobram? Se quiser gozar,
masturbe-se no quarto escuro, com a porta trancada, com os olhos fechados,
pensando na Mulher Maravilha lavando as cuecas machistas do Super Homem. Para
Mim, você, menininha arrogante, nem para depósito de porra serve. Vai para a
Minha biografia de sádico, apenas como mais um dispositivo portátil de
desprezo”.
O grito de frustração em desespero que escutei após fechar a porta em
Minhas costas seria perfeito para sonorizar o quadro do Edvard Munch.
Se a vingança é um prato que se come frio, aquela Eu degustei como picolé
& fez até valer muito a orgiástica & chafarística punheta que fui
obrigado a tocar naquela noite.
Como sempre digo, só há um prazer quase comparável ao de se ter as
mulheres que se deseja: poder rejeitar aquelas que se despreza.
A matéria jamais foi publicada. A revista esquerdoide para classe merdia
alegou questões com a censura militar. Na verdade, ninguém teria colhões para,
ainda mais àquela época, divulgar um texto, que ela Me enviou, finalizado com o
seguinte parágrafo: “Protagonizar uma
sessão de sadomasoquismo alterou permanentemente minha existência enquanto
mulher. O S&M agora é a tragédia
onde gargalho, a comédia onde choro. A cela onde me liberto. O deserto que me
aprisiona. A armadilha que sei que não devo, mas na qual quero ser aprisionada.
É o barulho que me acalma, o silêncio que me ensurdece. É a origem do mundo
& a morte pela qual ele renascerá. Sempre excesso & falta. Sempre sacro
& obsceno. Invasor e bem vindo. É onde esqueço meu nome, onde me lembro de
mim. Onde o dominador me lembra. Onde me esqueço. Onde me desequilibro. Onde
escapo. Onde me capturo entregando-me em escravidão. Hermética simplicidade sem
códigos. Faca e carne. É o caminho
conhecido onde me perco. É o desconhecido onde me encontro. Ali vivo depressa
& morro lenta com vontade de ressuscitar. Nunca mais serei a mesma que ali
chegou pela primeira vez. Lugar onde meus silêncios se encontraram &
encontraram o lugar exato para se gritar escravos na obediência. E a eloquência
dos golpes da chibata ensinou: A DOR PREMIA COM PRAZER!”
Tentou mais um contato pessoal, por algumas vezes ainda implorou por
outra sessão. Inútil. Ignorei. Depois de
um tempo, soube, casou-se com um rico empresário católico & foi viver num
país meio congelado do Norte. Por alguns anos a assisti, sucesso,
correspondente internacional na televisão de maior audiência. Então a areia da
ampulheta cobriu a lembrança com a indiferença, o tempo escorreu anos & levou com ele a maioria dos conceitos,
preconceitos, slogans idiotas & a certeza imbecil de chavões, clichês &
frases-manifesto.
Não mais a soube.
Até quando estourou escândalo com um alto dirigente político
internacional envolvido em práticas sadomasoquistas, comandadas pela esposa de
um poderoso empresário, que atendia pelo apelido de “Mulher Maravilha” &
que tinha tatuada na nádega direita a frase: “A Dor Premia Com Prazer”.