segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Variações sobre um mesmo corpo (3º lugar no I Concurso de Contos e Poesias BDSM-Votação do Júri)

Foto: Headsick Pinups


        “What a glorious feeling
I’m happy again”
(Brown/Freed)

 Adágio
As chamas dos quatro círios dançam bailarinas logo às primeiras notas da “Nona” do velho Ludwig Van que começam a se infiltrar na escuridão do ambiente, dissimuladas como crianças pecadoras.
Como correr em pânico ouvindo atrás de si os passos pesados do medo se aproximando mais e mais. "Escutar atrás de si o ressoar dos passos de um gigante", disse Brahms.
Cera derretida escorre quente sobre o brilho da prata. Choram ou gozam as velas?
Nua.
Depilada, totalmente, como sempre lhe foi ordenado.
Carnes caminham brilhando brancas na pouca luminosidade.
O corpo quase o mesmo que na primeira vez implorou para ser seviciado por Mim. Sem segredos agora, mas ainda capaz de apresentar surpresas desde que se saiba procurá-las, despertá-las.
Meses, quase um ano.
Quando comecei a modelá-la ao papel que ela enfim assumiria: um mero objeto de uso com a finalidade de Me proporcionar prazer.
O pleno manuseio de corpo e alma para ensinar a simples mulher a despertar para a função de escrava e aprender a desfrutar desse papel.
O olhar de comando é desnecessário.   
Cada reação previsível trabalhada em sessões e sessões de treinamento minucioso, administrando a frágil fronteira entre o castigo e o abuso, despertando a curiosidade para o desconhecido dos limites, do caminho não traçado para alcançá-los, do prazer único de poder virar o olhar e ver-se o quanto foi delicioso superá-los, deixá-los para trás.
Submissas são como insetos: uma vez que conhecem a luz têm o desejo suicida de atirar-se em direção a ela, mesmo que esse mergulho no prazer possa significar a cegueira ou até a morte.
Após a primeira bofetada soube que jamais retornaria à sua antiga vida mesmo que quisesse. Foram desafios contínuos, sempre em desenvolvimento infinitos na medida da imaginação. Só se constrói algo realmente novo depois de se destruir as ruínas.
Os primeiros passos vacilantes, temerosos. Depois a corrida alucinada em que jamais se deve olhar para trás. O que ficou para trás não existe, não é mais da pessoa. A escrava mata e enterra a antiga mulher. Não consegue imaginar uma vida mais gratificante em termos de prazer. O alcance do prazer pela submissão da escravidão severa, à beira da degradação, é uma escolha sem volta.
O sexo é capaz de matar a sede por tesão mas o que Eu lhe ensinara a deixaria embriagada para sempre.
Deita-se sobre o mármore negro da mesa como sabe que deve.
O sentimento do desconhecido à espreita desestabilizando qualquer tentativa de compreensão.
Sabe que não espero nada menos do que obediência total. Entrega-se para poder proporcionar-Me a plenitude de Minha vontade.
Teme falhar em qualquer detalhe mínimo.
A friagem eterna do mármore.
Estremece um tanto.
Arrepio momentâneo.
Poros salientes.
Altar pagão, profano, carnívoro, sacrificial.
Ela oferenda às divindades do prazer e da dor.
Eu sacerdote do culto de sua entrega.
O frio da pedra gelado como o abraço de uma morte gratificante.
Mas não morte.
Uma celebração à plenitude da vida.
Uma ode à alegria.
Tempo de saber do delicioso cinismo de sermos o anjo caído de nosso paraíso interior do que sermos o anjo de sorriso apatetado e conformista do inferno dos outros. É o jeito de se sentir hoje como os deuses de antigamente, como os deuses que são de sempre, embora nos esqueçamos disso. Estar bêbado de uma forma que nenhum bebedor de vinho jamais poderá desfrutar.
Só aquele que conhece em profundidade toda a beleza da obra em sua plenitude, do introito ao gran finale, sabe desfrutar da delícia exata e medida da duração que deve ser dada à execução de cada movimento, sem pressa ou demora, cada parte em si deliciosa fazendo parte de uma delícia mais completa.
Meses, quase um ano.
Quando veio a Mim, implorando que lhe fosse concedido o desprezo de Minha impiedade era apenas um delicioso e fodível pedaço de carne. Branca, muito branca, sem qualquer marca. Porém amorfa, apesar das formas deliciosas, sem alma, sem existência. Mulher sem ser fêmea. Ali reunidos todos os instrumentos todos os naipes à disposição de Minha regência para que Eu executasse Minha sonata de impiedade, prazer e gozo. Mas já na primeira sessão ela esteve então totalmente aberta, indefesa e então Eu, pisoteando todos os seus homens anteriores, invadi seu sangue e a aprisionei para sempre em seus próprios sentimentos até que um dia viesse a morrer. Tatuei no mais profundo ponto de sua alma o gosto do gozo pelo prazer da dor e da servidão. Gargalhei na face de todos os demônios que saíram de seu corpo ao primeiro golpe de Minha chibata.

Allegro

A friagem eterna do mármore negro da mesa.
Os círios gozam ansiedade de cera derretida sobre o brilho da prata.
Executar em seu corpo Minha “Sonata de um Carrasco para qualquer mulher”.
Aqui mais uma vez: apenas um pedaço de carne pronto a transmudar-se à Minha vontade em algo vivo no prazer, a partir de Meu comando.
O movimento de Minha mão subindo de seus peitos em direção à sua boca.
Domínio pleno.
Jamais perdi tempo em aplicar-lhe uma mordaça. Bastava a pressão firme de Minha mão cobrindo sua boca, seus olhos se arregalavam e ela sabia: não deveria emitir qualquer som para gemer, gozar, queixar-se, agradecer, rir ou chorar.
Não deveria lutar. Seria inútil. Apenas poderia se ferir mais, sofrer mais. Algo que ansiava mas sabia só poder usufruir se Eu permitisse.
Mesmo quando não a seviciava, apenas pelo olhar ela sabia que Eu detinha o controle. Não era necessária a força. Seus olhos arregalados de medo logo baixavam quando ouviam: “Não admito que olhe diretamente para Mim sem Minha permissão”.
Sempre preferi usar a sutileza do amedrontamento como forma de controle no lugar da violência ou da força bruta. É como se faz uma escrava de uma simples mulher. Controlar a mente e não apenas o corpo. Medo maior do que o da dor física, do desprezo que poderia vir por considerá-la indigna de ser um objeto de Meu uso.
Havia passado por tanto antes, mas sabia que sua vida agora se dividia em ter sido usada antes de Mim e depois de Mim. Soube que Eu era forte o suficiente para dominá-la apenas com o poder de um pensamento, sem a necessidade de um momento de violência física ou moral.
E passou a ansiar por isso. O tremor do corpo e da alma dividido entre o medo e a ansiedade pelo prazer. A alegria infantil de uma criança rindo num quarto escuro.
Fácil perceber agora seu corpo tremendo e os pequenos soluços que faz força para engolir para não enfrentar Minha raiva. Sabe o que não lhe é permitido.
Apavorada luta contra o medo, tenta manter o controle sobre a respiração funda, mas é impossível. Seu nariz respira nervoso quando agarro seu rosto.
Lindo, realmente lindo assistir aquele pedaço de carne vomitando saliva e chorando lágrimas sem choro.
O medo sabendo que a desobediência não será tolerada. O sentimento de desamparo é total e quero que ela sinta isso completamente, a cada instante. O medo líquido misturado ao desejo de prazer escorrendo por cada uma de suas lágrimas grossas e quentes.
A bofetada estala com o peso certo em seu rosto. Engole o ganido de cadela ferida. Proibida de expressar seu sofrimento com sons. A humilhante dor de um instante parecendo durar séculos.
Ofega agora.
Nada conseguiria dizer nem que lhe fosse concedida permissão para falar.
Agarro com força seus cabelos e digo: “Você nem está pensando em Me deixar com raiva, está?” Morde o lábio com força e deixa o sangue escorrer generoso. A dor auto infligida vale pelo sacrifício de não ser punida por chorar.
Minha mão cobre sua boca, ela quer gritar apesar de proibida. Arregala os olhos para comprovar que a falta de respiração reafirma sua fragilidade como Minha propriedade de vida e morte. A confiança irrestrita, porém, grita em seus ouvidos que pode relaxar e deixar seu destino flutuar totalmente entregue à Minha vontade.
O temor a ataca por todos os lados. Olhar apreensivo. Todas as emoções de uma fêmea espalhadas ao mesmo tempo nesse rosto de escrava exposta, indefesa. Saber que sempre poderá ser surpreendida em ser tratada com ainda maior crueldade. E desejar. E recompensar-se na vergonha, na humilhação de ansiar pelo sorriso de desprezo que lhe endereço.
Sabe: qualquer hesitação em obedecer gerará punição. Nervosamente morde de novo o lábio até sentir o sabor de sangue.
O rosto pálido.
O medo fala apavorado pelos seus olhos. Sou o sonhado personagem central de seus pesadelos.
Braços esticados para trás buscando o infinito. Sabe que é assim que devem ficar. A obediência é mais imobilizadora do que qualquer amarração.
Sem clemência.
A dor mais terrível infiltra-se então pelo bico do seio torcido. Cada beliscão nos seios é um sinal para que sua boceta se contraia em tesão. Agora os dois peitos atormentados ao mesmo tempo. Tenta tomar fôlego depois de cada apertão.
Até onde a dor pode chegar?
Seja onde for ela estará lá aberta em agonia para acolhê-la inteira. Chorando quieta em reverência ao gozo que experimenta.
A mordida feroz no bico do seio lhe dá a oportunidade do único grito de dor que dará durante todo o tempo em que estiver sofrendo sob Minhas mãos.
O quanto de dor esse corpo pode receber, suportar, e corresponder para proporcionar prazer e ainda sentir-se sexualmente gratificada com tudo isso?
Sente transbordar o nível de suas lágrimas e gritos surdos, ouve interiormente todos os gemidos que não pode exprimir. Agonia é o nome desse sentimento.
Por seu olhar assustado o desespero grita pedindo por socorro.
Queimação nos peitos. A ponta acesa do cigarro passeia lenta esquentando a pele. O calor se expande pelo seu corpo. O chicote golpeando seus peitos e estômago. As marcas vermelhas em suas coxas generosas.
Ofega tentando minimizar a dor que não pode ser libertada em gritos ou gemidos. Inútil. Seu queixo seguro em Minha mão firme, a dor  umedecendo seus olhos.
Mamilos torcidos e sabe que apesar da dor não deve lutar pois o sofrimento pode tornar-se insuportável. Torcendo e torcendo até vê-la empalidecer. Quanto mais aperto, mais sinto os bicos de seus seios crescerem e endurecerem entre Meus dedos. Sei que o nível de sofrimento está próximo ao insuportável. Satisfação na dor.
Mamilos doloridos, o vibrador enterrado fundo em sua boceta zumbe como um inseto elétrico enlouquecido de tesão. Tentou, mas não pôde evitar: a urina escorre generosa de dentro dela. Agarro seus cabelos, manuseio sua cabeça com desprezo violento e esfrego seu rosto no mijo.
Ponta de língua quente limpa as lágrimas que recolho dos cantos de seus olhos com a ponta do cacete, obrigando-a a lamber o salgado de sua dor na cabeça de Meu pau.
A sensação de sufocamento com Meu caralho invadindo sua boca. Uma estocada sem preocupação com cuidados e a dor ardendo na garganta, um jato de urina quente e ela tem a paz da sede saciada que não sentia há muito tempo.
Um demente sorriso opressivo de agradecimento nos lábios.
Seu corpo agora forma um X, braços abertos, pernas esparramadas em abertura máxima.
Levo as mãos a seus seios e aperto enquanto canto obscenidades e insultos em seus ouvidos. Seus peitos respiram forte, Me aplaudem.
Minhas mãos vão abaixo percorrendo suas coxas, separando ainda mais suas pernas com violência.
Abandonada.
Não resiste, expõe o corpo disponível e desfrutável a Mim.
Sua reação natural de fechar as pernas agora inexiste.
Sente como se estivesse ali sofrendo há horas, mas são apenas alguns minutos. Na dominação, ela sabe, o tempo arrasta-se na velocidade estudada de um predador na preparação do bote sobre a presa. Tantas vezes já esteve nessa posição, mas agora e a cada vez é como se fosse a primeira, inédita. Teve todo o tempo que lhe concedi para descobrir essa verdade tão simples e tão dura ao mesmo tempo.
Meus dedos trabalham a umidade do meio de suas pernas. Reage à excitação. Depois vão à sua boca. Lambe cada centímetro de cada dedo melado com a ansiedade de um esfomeado.
A alma da mulher se revela no escorrimento de seu gozo.
Meu dedo esfrega-se pesado em seu grelo endurecido, cada respiração desfrutando de sentimentos novos criados a cada deslizamento de Meu dedo para dentro e para fora de seu buraco molhado.
Sua fenda risonha baba admiração, espuma e grita “Bravo!” Um gemido animal corre atropelado do fundo de sua garganta e sai por seus lábios como um agradecimento.
Sua boceta jamais Me negou um sorriso.
Ou um beijo.
Lambo as beiradas até sentir seu sexo se dissolver em Minha língua. Uma massa mastigável, pastosa, escorrendo sucos pegajosos, grudentos Me encara.
A mordida é selvagem.
Lábios úmidos mastigados entre Meus dentes. Ondas de dor se irradiando de sua boceta por todo seu baixo ventre. O tesão indescritível para quem não sabe dessas coisas.
Proibida de chorar, perto das lágrimas mas proibida de chorar, ela ofega, respira profundamente.
Afasta as pernas ao máximo expondo a boceta. Minha mão entra, desaparece dentro dela. Contorce o corpo em convulsões. O desconforto existe em cada tremor de seu corpo mas ela esforça-se.
Nada demonstra.
Fico contente em constatar que como sempre ela continua respondendo aos Meus comandos.
Um grunhido surdo.
Lágrimas envergonhadas tentando não escapar dos cantos de seus olhos apertados.
Adivinhou que chegaria, mas não pôde evitar uma contração ao sentir a ponta de Minha rola entrando forte e direta pelo centro de seu corpo e alargando as paredes de sua boceta. Geme tesão sobre tesão a cada empurrão. Deixa Meu cacete deslizar até o fundo, passeando com autoridade pelo seu interior. Quando enfio firme as pontas dos dedos nas carnes de suas nádegas e acelero, concentra-se para acolher fundo, sempre mais fundo e no mais profundo lugar de sua sexualidade recolher cada gota do jorro Minha gozada.
Sente-se partida ao meio, a lubrificação natural aumenta, percebe pelo inchaço de Meu cacete que estou para gozar e força o ventre para cima com determinação, tremendo convulsivamente enquanto Minha porra começa a transbordar gotejando pela lateral de suas coxas.
Um ritmo peculiar e familiar em sua respiração anuncia o orgasmo generoso que está construindo a cada estocada que experimenta e que agora vem alucinado entre soluços e inunda o vão de suas coxas.
Uma substância quente e pegajosa, mistura dela e de Mim, escorre de dentro dela.
Arranco com rapidez -  som engraçado - o pau de sua boceta.
A boca aberta espera morna, língua faminta, para saborear no fundo da garganta acolhedora a mistura pegajosa de nossos gozos e suores que derramo em sua saliva grossa.
Cadela faminta suga, engole depravada. Cadela lambendo satisfeita apenas por poder ser cadela lambedora.
Virada com violência.
Uma parte dela quer mergulhar na delícia escura do desconhecido. Outra teme pela luminosidade da certeza do medo sem disfarces.
A dor de Minha mordida espalha-se afiada pela carne generosa das bochechas de seu traseiro de cadela.
Movo vagarosamente Minha mão pelas carnes redondas de sua bunda e sinto Meu dedo maior entrar fundo no buraco de seu rabo.
Um gemido.
No começo alguma resistência, depois caminho aberto.
Apanho a chibata e faço as tiras passearem leves e suaves pela pele de sua bunda.
Tensa, absolutamente imóvel.
Sabe o que estava por vir.
Quer logo a primeira lambida dolorida do couro. A protelação só aumenta seu tormento.
Começo a bater forte, flagelação num ritmo marcado, gradativamente aumentando a violência de cada golpe.
Cada pedaço ferido de suas carnes testemunha todas as vezes que sem dúvidas, confiança cega, entrega à sorte de sua satisfação de fêmea à Minha vontade.
O gran finale se aproxima.
A certeza de desconhecidas surpresas por todo o caminho até a meta final. Um delírio de indagações, de dúvidas. A alternância entre um pânico quase cego e um sentimento de felicidade impossível de ser transmitido a quem quer que seja. Mas quem garante que a Minha vontade não criará novas surpresas?
É estar sempre preparada para mostrar-se rendida.
A Minha vontade é desconhecida.
Agradece aos berros – “Obrigada senhor!” - por ser tratada como uma vadia e implora que nunca pare de bater.
Marcas de submissão tingindo de roxo aquela pele tão branca.
A carne responde sonora a cada vergastada do açoite. Terá de suportar todas as pancadas. Sejam elas tantas quantas Minha vontade desejar.
Sua bunda ostenta um luminoso vermelho. O calor da dor do espancamento é sensível à distância. A carne ferida de vida tomando novas formas a cada pancada como se o sangue, quase numa pulsação, quisesse vir correr à superfície da pele. O vermelho aos poucos desaparece, substituído pelo azulado.
Fogo puro caminha por cada centímetro daquela pele que Eu incendeio com as tiras da chibata.
A dor é insuportável mas silencia.
Seu orgulho de mulher odeia o total controle que exerço sobre a fêmea. O importante, porém, era a satisfação que esse ódio lhe proporciona, ao cuspir na face de sua alma de submissa o quanto necessita da delícia de sua impotência e de necessitar ser tratada desse modo indigno.
Mesmo olhos fechados pelo ardor que passeia vermelho e quente por sua pele, sabe que a estou encarando. Tem certeza de algo estranho em Meu olhar e a indefinição da estranheza da surpresa tempera na exata proporção a mistura entre prazer e dor. Algo quase imperceptível, entre a alegria da transgressão infantil e a depravação, passeia pelo interior de sua alma e sai correndo por seus lábios apertados com uma risadinha irônica de deboche.
Agora possuí-la por trás.
A bunda arreganhando-se, empinada, ânus à mostra.
Não é sujo, é sujo, delicioso, transgressivo, algo delinquente, imundo e belo ao mesmo tempo.
Mãos firmes, afasto as bochechas de sua bunda, empurro com decisão vencendo a breve resistência da carne assaltada, afundo em seu cu.
Saborear a sensação de Meu pau conquistando a passagem apertada de seu rabo.
Nádegas carnosas se abrindo e se fechando no ritmo de Minhas entradas e recuos cada vez mais rápidos e profundos.
Não importa quanta dor sinta. Impossível impedir. Porque não deseja. Não há nada que deseje fazer para aliviar o que sente. Seu corpo treme ligeiramente a cada entrada, um ou outro gemido abafado. Mesmo de costas adivinha Meu olhar sorrindo. Apenas volta o rosto para trás quando depois de gozar saio dela e então oferece a boca para limpar Meu pau com lambidas de saliva faminta.
Presto

A friagem eterna do mármore negro da mesa.
Os círios quase morrendo choram exaustão de cera derretida sobre o brilho da prata.
Meses, quase um ano.
Ao verdadeiro artista importa a música, não o instrumento. Manter-se muito tempo com a mesma escrava é a vitória da conveniência sobre a imaginação.
O prazer do sexo é como um vinho delicado que deve ser bebido assim que a garrafa for aberta, senão pode desandar em vinagre.
Depois de um tempo, tê-la como objeto de uso passou a ser como jantar começando pela sobremesa sem se importar com a qualidade ou o tipo do vinho.
Hoje foi a clockwork session quando todos os ponteiros da dor e do prazer  giraram em todas as direções.
Ainda foi super horrorshow toltchocar esse corpo e ver o krovvy escorrendo gréjine enquanto o medo fez caretas no rosto dessa devótcheca, embora ela hoje não seja mais uma ptisa, pois é uma tchina de grudes quase querendo cair, já meio sunca, mas ainda aproveitável para lubilúbi.
Meus drugues adorariam.
Mas há muito não falo mais dessa maneira nem chamo Meus amigos de drugues, nem eles Me chamam mais de Alex.
Agora Sou Sir Large como exijo ser chamado por todas para que demonstrem respeito e gratidão à caridade da dor e prazer que lhes concedo segundo Minha vontade soberana.
Foi a canção de adeus.
Ela sabia. (Pensava que Eu não soubesse).
Eu não precisava.
Vale mais a caça do que a presa.
Preferível que jamais saiba que está sendo doada como objeto de caridade a outro que Me solicitou suas carnes para poder usufruir tudo o quanto construí nesse corpo e nessa mente.
Ainda a mesma hoje, ainda a mesma postura servil de sempre: ajoelhada, mãos cruzadas nas costas, cabeça curvada, língua úmida saboreando o couro de Minhas botas.
Hesitação.
Uma faísca indecisa de medo em seu olhar.
Coração batendo forte atreve-se, voz confusa, à transgressão de falar sem permissão. Sussura, desejando que o mundo todo a ouvisse gritando: “Posso voltar? Outra vez, quando o Senhor desejar, Sir Large?”
A bofetada afiada explode seca e sonora em sua face.
Tenta manter os olhos respeitosamente fechados, mas o puxão violento nos cabelos agarrados por trás a impede. A boca assustada. Respiração descompassada. Fôlego suspenso agora. Pânico. Atordoada pelo tapa. O teto gira em seus olhos arregalados.
Toda escrava sabe que cada uma vive seu próprio cativeiro particular, único.
Os mesmos olhos amedrontados que mostrava no princípio de seu treinamento.
O medo é frio, gelado.
A angústia do desejo opressivo de querer chorar.
Poderia. Punições agora não viriam. Seriam inúteis.
Pálida.
Uma gelada onda de medo percorre sua espinha abaixo e instala-se funda, apertando sua alma.
Tremendo ligeiramente veste peça por peça de roupa sem coragem de Me olhar.
A penalidade maior, a única que saberia não suportar, pior do que todas as dores doendo juntas: Meu desprezo.
O pior que se pode dar a uma amante é a condescendência no sexo. Se quiser matá-la por dentro, despreze-a.
Calada.
A certeza da habilidade adquirida em saber adivinhar Meus pensamentos.
Olhos baixados para o chão, lágrimas se formando. Não de dor, mas de humilhação. Pensamentos em balbúrdia, transparentes como fantasmas, sem substância.
Vacilante, apenas abre a porta e vai embora.
Não consigo, aliás nem quero, evitar o sorriso de cinismo e ironia.
Logo estará no avião indo ao encontro de seu novo dono para servir a ele. Afinal terá de pagar a viagem grátis de alguma maneira.
Eu?
“I'm just dancin' and singin' in the rain”.

 

terça-feira, 20 de novembro de 2012

... once upon a time...

Foto: Frederic Fontenoy


“E isto então? Isto não é um livro. Isto é injúria, calúnia, difamação de caráter. Isto não é um livro, no sentido comum da palavra. Não, isto é um prolongado insulto, uma cusparada na cara da Arte, um pontapé no traseiro de Deus, do Homem, do Destino, do Tempo, do Amor, da Beleza... e do que mais quiserem. Vou cantar para você, um pouco desafinado talvez, mas vou cantar. Cantarei enquanto você coaxa, dançarei sobre seu cadáver sujo... “ (Henry Miller)

Tremenda porrada na cara de um moleque pré-adolescente que no início dos sessenta dos milenovecentos tinha lido pouco mais, pouco menos possível a um moleque pré-adolescente, ao ser escarrado por esse parágrafo logo nas primeiras páginas de uma edição super enrustida de “Trópico de Câncer”. Nem imaginar as maravilhas que viriam nas centenas de páginas posteriores, ou consciência de que esta “porrada” estava sendo desferida na face da hipocrisia do mundo desde uns trinta anos atrás. Não importava desconhecer que outros antes já estavam brigando essa boa briga contra o “bomgostismo academicoide literário” sem se importarem em ser considerados perdedores e serem chamados, no mínimo, de “malditos”.

Foi com meu amigo “Moleiro” (apesar dos tantos outros distribuidores de “porradas literárias” que vim a ler/conhecer) que permaneceu como meu predileto (sorry, forgive Me Joyce, if you can), que descobri ser possível escrever do jeito que se vive, as coisas que se vive e que “desafinar o coro dos contentes” (salve, prematuramente auto desvivido Torquato Neto) é uma felicidade incômoda, mas que propicia um tesão transgressivo indescritível.

A tomada de consciência em relação ao S&M só fez arder a pimenta exata no realce adequado do tempero desse peculiar paladar que passou a caracterizar as literatices cometidas pelo moleque pré-adolescente, especialmente quando já amadurado transmutou-se, entre outras personas, SadoMaster.-

Nesse canto infernal de maravilhas, apresento textos ficcionais - vivências e liberdades literárias conjugadas - no formato conto, focados essencialmente no sadomasoquismo ou em temas correlatos, que divulguei de maneira esparsa em alguns sítios, internéticos ou não. Em não muito tempo, inéditos virão.

As imagens,  modificadas ou não, que comentam visualmente os escritos, apresentadas sempre em P&B, mesmo quando não originalmente produzidas nessa técnica, espelham a elegida acromatopsia que tanto entesa quando retrata o sexo. A autoria, sempre que possível, será explicitada. Tomara os detentores de direitos permitam que sua arte continue a ser difundida e usufruída. Porém, quaisquer restrições serão respeitadas e acatadas.

Comentários, mais do que bem vindos, são estimulados. Desde de que expressos em linguagem  crítica apropriada, dentro dos limites da cortesia sem solenidade, não serão bloqueados, elogiosos ou não.

And last but no least, pra não dizer que não falei de Sade: “Não há outro inferno para o homem além da estupidez ou da maldade dos seus semelhantes”.

Maravilha!

Maravilhas!

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Até ontem

Foto: Adam Chilsom

Meu amor ferido
Era uma velha imagem
De uma rosa apunhalada
Ah,
Era tão romântico
Tão antiquado
O quadro do crime
O jeito como ferida
Mão no peito comovida...
(“O Crime”, José Carlos Capinan)



Até ontem.
Até ontem eu não conseguia imaginar como poderia durar mais um minuto sequer.
Ainda mais depois do que houve.
Até ontem.

Já havia durado demais.
Treze é um número cheio de significados. Exatamente treze anos: três de namoro e dez de casamento.
Não foi ontem que percebi que alguma coisa sempre faltava. Mas para qual casal não falta?
Culpa minha não podia ser. Sempre fui conhecido e reconhecido como um sujeito tremendamente competente em termos de sexo e com um pau de tamanho mais do que acima da média. “O Jumento”, brincavam os amigos. E não estavam se referindo à minha inteligência. Eu tinha certeza.

Desde a primeira vez ela sempre gozou como uma alucinada. Já havia tido alguns caras antes de mim. E olha que eu nunca me incomodei com isso. Sempre fui mais eu. Apostava tudo no meu “taco”. Literalmente.
Porém, eu percebia que inteiramente satisfeita, satisfeita ela não estava. Bom, mas qual mulher consegue estar plenamente satisfeita quando a questão é sexo? Quem sabe o que se passa lá dentro delas?
Eram sete fodas por semana que ela levava — sem contar as rapidinhas de vez em quando pela manhã e, às vezes, umas extras em datas especiais como aniversário de casamento, Natal, férias na praia ou depois de uns uisquinhos a mais. Não tinha do que reclamar e meu pau era testemunha orgulhosa da obra de alargamento que havia promovido em pouco mais de dez anos naquele vão de pernas.
Brigas? No nível normal. A maior parte quase sempre depois dessas trepadas monumentais em que ela gozava num volume de gritos capaz de acordar os vizinhos (Sempre achei que aquele idiota sorriso amável que às vezes o Mello me endereçava, quando pela manhã nos encontrávamos no elevador, era de pura inveja pelo que escutava através das paredes à noite). Era aquele nhén-nhén-nhén de que “apesar de todos esses anos você não me conhece, só um pau grande não é tudo, você não sabe nada sobre mim, sobre o que eu quero”, enfim a resmungação padrão de toda mulher.
Não tinha do que reclamar. Sempre a respeitei como mulher e como fêmea. Nunca fiz com ela aquelas coisas que só se fazem com putas. Para isso existem as putas. Então quando eu estava com vontade de fazer uma dessas coisas eu procurava uma puta, porque virilidade de sobra para isso nunca me faltou, graças a Deus.
Enfim, uma vida de casal normal.
Até ontem.

E para quem as coisas andam bem hoje em dia?
Dá para estar satisfeito com a economia desse país desse jeito?
E quem aquele corno do dr Cristino pensava que era para me demitir, depois de quase vinte anos, assim dessa maneira, sem mais nem menos?
Está certo, está certo, quatro uísques seguidos eram muito acima da minha cota, ainda mais numa terça-feira. Mas bêbado eu não estava. Só com o humor um pouco alterado. E qual desempregado não estaria?
Ela nem percebeu quando cheguei.
Estava na cozinha, em frente à mesa, mexendo com alguma coisa de comida que iria virar o jantar.
Sempre tinha desejado, nunca me atrevido. Não sei se eram os uísques, mas juro que nunca havia olhado para a bunda dela daquela maneira.
Até ontem.

Não sei o que deu em mim.
Violento? Sim, um pouco. Talvez muito.
Nem dei bola para o susto e para a tentativa de protesto dela.
Com a mão esquerda agarrei-a pela nuca, esmaguei seu rosto contra o tampo da mesa. Com a direita levantei o vestido, arranquei/rasguei a calcinha, tirei o pau para fora e fui empurrando com vontade, assim a seco mesmo, sem nem me incomodar que era a primeira vez para ela.
Os gritos dessa vez eram mais altos, de dor, de medo, dava para perceber. Mas o calor daquele botão de cu virgem que em treze anos eu quis ignorar era hipnótico. Não existia mais nada no mundo, desemprego, o caralho: só meu pau rasgando prega por prega daquele buraco quente. Quando cheguei ao fundo, uma estocada mais poderosa, dei um suspiro, recuperei a respiração e comecei a entrar e sair, entrar e sair, entrar e sair. Nada mais importava no mundo, só estar indo e vindo dentro daquele rabo. Os berros dela passaram a ser de conformismo, de impotência, talvez de entrega conformada. Sua transpiração fazia com que minha mão escorregasse de sua nuca, mas eu voltava a imobilizá-la firme, sem permitir escape. Era a delícia das delícias e eu nunca soubera.
Até ontem.



Não sei quanto tempo durou. Só meu pau, estava enorme como eu nunca tinha visto, até ontem, entrando e saindo, os gritos, o suor. Nenhuma palavra de nós dois.
Talvez eu jamais tivesse parado, mesmo depois que gozasse, mas a cor vermelha me fez entrar em pânico.
Havia marcas de um vermelho muito forte em sua nádega direita: meus dedos apertavam sua carne como se fosse somente, simplesmente... carne.
O atrito, de um momento para o outro, havia ficado mais folgado e escorregadio. O calor, agora eu sentia, era úmido, melado, quase pegajoso. Olhei para baixo: havia uma ou outra partícula de cor mais escura, mas a maior parte era sangue puro, vermelho puro, puríssimo. Sangue pra caralho, sem trocadilho.
Eu estava quase gozando, ia gozar de uma forma como nunca antes tinha gozado, até ontem.
Mas saí.
Dobrada sobre a mesa ela era uma hemorrágica catarata sanguínea acoplada a um corpo de mulher pelo cu.
Medo e vergonha.
Ela se virou e me olhou com um espantalhado olhar de incredulidade, porém firme. Apertava a mão direita contra a boceta enquanto com a esquerda debulhava nervosamente o bico de um seio. Sua face estava começando a ficar roxa. Acho que tinha se machucado ao ser mantida empurrada de encontro ao tampo da mesa.
Só consegui baixar os olhos e dizer: “Desculpe, eu não queria...”.
Nunca tinha visto aquela expressão de ódio em seus olhos. Até ontem.
Veio o nhén-nhén-nhén de sempre, só que agora com raiva de cadela chutada, ferida, mas com algumas alterações.
“Apesar de todos esses anos você não me conhece, só um pau grande não é tudo, você não sabe nada sobre mim, sobre o que eu quero. Seu escroto, seu escroto! Você é um bosta de homem!”.

Nenhum homem que se diz homem deve ouvir isso e ficar quieto.
Levantei a mão e lancei a bofetada furiosa.
Eu nunca havia batido nela.
Até ontem.
A figura dela tonteou ante meus olhos. Joelhos fracos. Tremendo. Eu.
Aí eu vi e não acreditei no que vi.
Até ontem.
As lágrimas desceram rápidas e brilhantes num excitante contraste com o ritmo enervantemente lento com que a gota de sangue escorria grossa do canto esquerdo de seu agradecido sorriso perverso de gozo.

Até ontem eu não conseguia imaginar como poderia durar mais um minuto sequer.
Ainda mais depois do que houve.
Isso foi ontem.
Agora sei que vai durar muito, talvez para sempre. E vai ser de um jeito que nunca foi.
Até ontem.